Wednesday, March 08, 2006

23. O caso da mulher com um olho de vidro (cont.)

5.

Num pequeno quarto do St. James Hospital, Bronco Vale, com
o ombro direito ligado, dormitava. Sentada junto ao leito, a
sra. Marlowe lia o Wall Street Journal.
Eram cinco da tarde e o quarto estava superaquecido.
Bronco abriu um olho e depois o outro, focando.
- Olá... - disse debilmente.
- Boa tarde, senhor Bronco Vale - e dobrou calmamente o
jornal.
- Para quem? - perguntou ele.
- Dói-lhe muito?
- Só quando me rio, segundo a velha piada.
- Pelos vistos, descobriu alguma coisa...
- Hum... acho que sim... mas é uma ponta muito frágil. Talvez
dê e talvez não.
Ela ajeitou-lhe a almofada e a roupa da cama, sem que
houvesse necessidade, claro. Estava tudo direitinho, como em
qualquer clínica de telenovela ou de série.
- Já estava quase a desistir... se não fosse o tiro, já teria
abandonado este caso...
A sra. Marlowe voltou a sentar-se. Estava um espanto. Bem
vestida e bem pintada. Apenas apresentava um ar cansado
ou, talvez, apreensivo.
- Senhor Bronco.
- Sim?
- Desculpe... ter-lhe chamado covarde.
Via-se claramente que ela fazia um esforço pois pedir desculpa,
não era bem de seu natural feitio. Ela mandava - não pedia
desculpa, ou por favor. Feitios de certas mulheres, o que
havemos de fazer? Mas agora actuava de maneira diferente.
Bronco sorriu levemente, tentando ser irónico:
- Chamou? Não me recordo. Devo ainda estar sob o efeito da
anestesia.
Ela pegou na carteira, no jornal e levantou-se, olhando-o quase
com piedade - ou seria já ternura?
- Precisa de alguma coisa?
- Não. O dr. Kildere não me deixa fumar, nem beber. Dentro de
dois ou três dias sairei... estou cheio de calmantes... adeus sra.
Marlowe... não me traga flores; basta-me a sua presença...
E fingiu adormecer, sorrindo interiormente. Aquela frase tinha
sido dita há muito tempo por Charles Boyer.
Linda ficou ainda uns segundos olhando-o. Depois saiu
elegantemente, com um lúbrico olho de Bronco pousado
interesseiramente no seu traseiro.
O tal olho lúbrico de Bronco estava enorme, parecia o de um
robalo ao se aperceber da presença de um tubarão.

(do livro do o mesmo nome de Ed B. Silverman)
--------------------

1 comment:

Anonymous said...

Venham mais capítulos...